segunda-feira, 9 de abril de 2012

Um conto:O Reizinho e o Sol de Vania Dohme & Walter Dohme

Era uma vez, dois irmãos que eram príncipes e se amavam muito. Quando cresceram, cada um foi reinar em um povoado vizinho. Mas, eles sempre se visitavam e trocavam idéias de como melhor atender ao seu povo. Assim, os dois reinos eram ricos e pacíficos.

Chegou o dia no qual um deles se casou. A princesa era muito bonita, e a festa foi maravilhosa. Por dez dias e dez noites, o povo dos dois povoados dançaram, beberam e comeram à vontade. Não demorou muito para que o primeiro filho nascesse, ele era bonito e saudável.

- Vou chamar meu irmão para padrinho da criança - pensou.

Mas, à noite, ele teve um sonho. Uma velhinha magrinha e toda vestida de verde apareceu e falou:

- Seu filho precisa de uma madrinha mais poderosa, pois não irá demorar e ele se tornará rei.

A princípio, o rei não acreditou, mas, por garantia, resolveu chamar uma fada sua amiga para batizá-lo. Ela veio com prazer e deu de presente ao príncipe um dom:

- Tudo o que o meu afilhado falar será obedecido! Não haverá homem ou ser fantástico que ouse

contrariá-lo!

O rei pensou que a velhinha do seu sonho poderia estar certa, pois o presente que a fada estava oferecendo era digno de um rei e não de um menininho. O menino foi crescendo e podia-se ver que o presente da fada estava funcionando. O cachorrinho real obedecia ao principezinho com rapidez, dava saltos e cambalhotas formidáveis.

Os sapos da lagoa, seus amigos, coaxavam na hora em que ele pedia e, para o seu deleite, cantavam lindas canções; e os ratinhos, também seus amigos, vinham correndo para brincar, bastava ele bater com as mãos uma vez.

Mas, esta calma teria um breve fim. O irmão do rei ficou doente e não podia mais governar o seu povo. Como não tinha filhos, seu irmão, o rei pai do príncipe, deveria acudi-lo. Todos acharam justo, pois o principezinho, embora tivesse apenas sete anos, poderia ser coroado rei.

E, assim, aconteceu que o príncipe foi coroado rei. A fada, sua madrinha, correu para a cerimônia e resolveu se hospedar no palácio para poder, mais de perto, orientar o afilhado. Mas, o reizinho não gostou muito de sua nova função, ele queria brincar e não ficar governando o povo. Os ministros sempre precisavam ir buscá-lo na lagoa, onde ele ficava brincando com os sapos e com sua bola de ouro; na cozinha, onde ele estava pulando corda com os ratos; ou no quarto de sua fada madrinha, onde ele ficava ouvindo histórias.

E, quando ele era obrigado a visitar o povoado, ficava só reclamando com tudo e com todos. Ele não queria ser rei, mas, principalmente, não gostava de se vestir de rei. A roupa era apertada, o manto era grosso e o deixava com muito calor, e a coroa de ouro era muito grande e lhe caía sobre os olhos de forma que ele quase não podia ver nada; além disso, ela esquentava muito com o Sol, e ele ficava com dor na cabeça.

Assim, seguia reclamando:

- Oh! Droga de coroa, não consigo ver nada. Droga de Sol, precisa estar tão quente?

Os ministros iam do seu lado abanando, mas de nada adiantava, ele continuava a reclamar:

- Droga de Sol, está me assando! Droga de coroa, droga de manto, é muito quente! Um dia, não mais agüentado, ele gritou:

- Vou tirar este manto e esta coroa! Não estou mais aqüentando tanto calor!

- Não, majestade, não faça isso! - falou o primeiro ministro. - O senhor é rei, e rei não perde nunca a sua compostura.

- O que é compostura? - perguntou o príncipe.

- É este porte real que o senhor tem, sua educação e elegância. É um comportamento que faz com que todas as pessoas percebam que o senhor é que é o rei. O príncipe não entendeu e também, embora fosse criança, pensou que ele não deveria ter esta tal de “compostura” principalmente com uma coroa que lhe afundava na cabeça e com um manto no qual vivia tropeçando.

- Bem, se não posso tirar este manto e nem a coroa, que tirem o Sol!

Os ministros se entreolharam assustados e a fada colocou a mão na boca e saiu assustada para o seu quarto, certamente para ler o seu livro de magia e ver o que poderia fazer nessa situação.

Como estava cansado, o reizinho foi dormir, nem se preocupando com os adultos, que pareciam estar muito preocupados. Ele dormiu bem gostoso e, quando acordou, olhou esperançoso para a janela para ver se ainda era noite, pois estava com muito sono e queria dormir mais. E ainda estava escuro! Que bom! Deu um salto para virar de lado e imediatamente começou a roncar de novo.

Depois de algumas horas, acordou novamente e pensou:

- Agora não tem jeito, deve ter amanhecido e terei de levantar. Mas, oh! Glória das glórias, ainda era “de noite” e ele poderia dormir mais um pouco. Ele jogou o travesseiro para o alto de tanta alegria e virou novamente de lado, puxando o lençol para cobrir a sua orelha e dormir aconchegadamente mais um pouco. E, assim, ele acordou mais duas vezes para olhar pela janela, e ainda estava escuro. Que noite comprida! pensou e, virava novamente de lado para dormir. Finalmente, chegou o momento em que a sua camareira entrou no seu quarto para acordá-lo:

- Vamos, reizinho, já é tarde. Você precisa levantar, já dormiu muito. Mas, quando ele olhou pela janela, viu que ainda estava escuro:

Mas, como quer que eu levante ainda de noite?

- Não, reizinho, já é manhã! É que o Sol não apareceu hoje! - respondeu a camareira.

- Não apareceu! É melhor mesmo, assim não irei passar calor.

No quarto ao lado, a fada, sua madrinha, chorava, pois estava arrependida com o dom que havia dado ao seu afilhado: o de sempre ser obedecido. Não pensou que poderia causar qualquer mal.

Mas, agora, tinha acontecido! O Sol havia obedecido à ordem do menino e tinha ido embora!

Mas, o reizinho não viu problema nisso, saiu para visitar o povoado, reclamando que a roupa era apertada e que a coroa lhe caía da cabeça, mas do calor ele não reclamou, pois o Sol não apareceu em momento algum.

O povo estava muito assustado, não sabia o que fazer. Com a escuridão, não podia levar as ovelhas para pastar, cuidar da lavoura, das crianças e da casa.

- O senhor não deveria ter dado esta ordem, o Sol obedeceu e agora todos estão passando maus momentos - falou o primeiro ministro.

- É, mas eu não estou passando calor, está bom assim! - falou o reizinho, só se preocupando com ele.

- Espero que amanhã o Sol apareça, pois será difícil conter o povo nesta situação – falou novamente o primeiro ministro.

Mas, o Sol não apareceu no dia seguinte e nem no outro. O povo começou a ficar muito agitado e procurou o reizinho.

- Mande o Sol voltar! Precisamos de luz! - falavam muitas pessoas em coro.

Até o reizinho começou a achar que não tinha feito coisa boa, pois, com a escuridão, tropeçava em todas as coisas, e já havia caído três vezes em um buraco.

- Ponham luz neste povoado! - gritou nervoso após ter batido o nariz em uma árvore.

Imediatamente, todos os empregados do reino saíram correndo colocando vela, lampiões e lamparinas por todo o lugar onde o reizinho iria passar. Mas, embora tudo tenha ficado bem mais claro, estava muito longe da claridade que o Sol trazia todos os dias. Enquanto isso, a fada, que sempre o acompanha, passava as noites lendo os seus livros para ver se encontrava uma forma de “desvirar” a sua magia, para que o reizinho não fosse mais obedecido cegamente, pois muitas catástrofes poderiam acontecer por isso, igual a essa, que tinha feito o Sol ir embora.

Mas, a iluminação não acalmou a população, as pessoas estavam com frio, as plantas começaram a murchar, e os sapos, fizeram uma fila enorme, um atrás do outro para ir embora, estavam se retirando porque com o frio que estava na lagoa eles não podiam viver.

- Façam fogueiras em cada palmo de terra que encontrarem, quero calor, meus amigos sapos não podem me abandonar.

E os empregados reais saíram colocando fogueiras para todo o lado para que o calor voltasse outra vez, mas nada, nada era igual ao calor do Sol.

Neste dia, a fadinha não veio, ela estava perto de encontrar a solução e havia ficado no castelo para fazer a poção. E, de repente: Pun catcha bum! Viu-se um clarão enorme, seguido de uma fumaça verde, sair da cozinha do palácio.

- Consegui! Fiz o antídoto. O reizinho será uma pessoa normal outra vez, e as pessoas só obedecerão a ele quando ele tiver razão - falou a fada com voz melodiosa, mas tão alta, que deu para ouvir no povoado.

À noite, a fada serviu a poção ao reizinho, que a tomou com muito gosto, pois ela tinha gosto de banana misturado com o de chocolate, que era do que ele mais gostava.

Foi bom ele ter se alegrado no jantar, pois, no dia seguinte, a sua visita ao povoado foi triste. Por onde passava a comitiva real, havia restos das fogueiras que haviam sido acesas no dia anterior, a lenha tinha acabado e o fogo se apagara, só havia cinzas e ainda se sentia o cheiro de fumaça no ar.

As pessoas estavam com frio, sujas e fedidas, pois não podiam se banhar com a água que havia congelado, pelo mesmo motivo elas também estavam com sede. Estavam também machucadas, de tanto tropicões que levavam. As flores tinham sumido e os sapos também.

- Ordene que o Sol volte - falou o primeiro ministro.- E mandaremos fazer um manto mais leve para o senhor.

O reizinho achou que deveria obedecer não pelo manto mais leve, mas sim pelas flores, pela natureza e pelo seu povo. Todos estavam sofrendo muito. E também por ele mesmo, pois estava com saudades do Sol quentinho batendo nas suas costas, de ver os raios refletindo na lagoa e o arco-íris, de que tanto gostava, aparecer quando chovia.

E assim falou:

- Sol, apareça! Tampou até os olhos com as mãos esperando que o Sol aparecesse imediatamente.

Mas nada, o Sol não apareceu.

- Saia, Sol, eu estou mandando! - berrava o pequeno rei, mas nada do Sol aparecer. O reizinho ficou espantado, pois não conhecia esta situação de não ser obedecido.

- Sol, aparece! - gritou, enfurecido.

- Não adianta fazer assim, eu tirei o seu poder - falou a fada.

- Mas, como você fez isso comigo?

- Poder só é bom quando a gente sabe usar. Você ainda é muito pequeno para isso, precisa crescer. Quando você ficar maior, eu pensarei em dar este poder de volta.

- Mas, e agora, fada madrinha, como iremos viver sem o Sol? - perguntou o reizinho realmente preocupado.

- Ele irá voltar quando ele quiser, pois, que eu saiba, ele foi morar com o seu pai, no povoado vizinho.

- Você acha que ele poderá voltar seu eu for chamá-lo? - perguntou o reizinho.

- É possível, se você falar com jeito. Podemos tentar, eu vou com você.

E, assim, os dois saíram em busca do Sol. Foram sozinhos, pois ninguém tinha coragem de cruzar a floresta com tamanha escuridão.

O tempo passou, quase um mês, e as pessoas ficaram sofrendo com a falta da luz e do calor do Sol. Um certo dia, as pessoas começaram a ouvir um barulho de carruagem e foram correndo até a entrada da cidade para ver o que era. Como levaram suas lanternas, viram que se tratava de uma carruagem linda, puxada por doze cavalos

brancos. Sentados na frente, estavam o reizinho e a fada, e atrás tinha um enorme pacote envolto em um tecido azul brilhante recoberto de estrelas.

O reizinho desceu da carruagem e, orgulhosamente, descobriu o pacote. Uma luz brilhante começou a aparecer. Felizes, todos perceberam que era o Sol que o reizinho estava trazendo de volta.

Com sua varinha, a fada fez alguns gestos e o Sol vagarosamente começou a se levantar e subir aos céus. Todos ficaram acenando até que ele parou, enorme e radiante, bem no meio do céu.

Todos ficaram apreciando o espetáculo sem perceber que havia mais alguém na carruagem. Era um homem, que deu um salto e gritou:

- Voltei! Meu irmão sarou e eu voltei para assumir o meu reinado!

Foi aí que todos perceberam que se tratava do rei, pai do reizinho, que havia voltado para reinar novamente. E todos ficaram felizes dando as boas vindas a ele.

E, assim, o reizinho virou novamente príncipe e ficou feliz por isso. Ele vive novamente com o seu cachorrinho, pulando corda com os ratos e conversando na lagoa com os sapos, nunca mais se queixou do Sol, pois viu como ele é útil e importante.

Ele sabe, também, que é muito pequeno para ser rei e prefere continuar brincando. A fada continua ao seu lado, e ele já disse para ela que, quando for grande e novamente rei, não quer os seus poderes de volta. Prefere que as pessoas lhe obedeçam somente quando ele tiver razão, pois ter mandando embora o Sol e sentido a sua falta foi uma grande lição.

Mensagem

Muitas vezes, só se dá valor àquilo que se tem quando se perde... O reizinho tinha muita coisa e nem percebia como estas coisas eram boas, por isso vivia reclamando. Ele só percebe a utilidade do Sol e a dependência que todos têm dele quando este, cansado, vai embora.

As crianças são um pouco como o reizinho. Desde quando nasceram, estão lá: o Sol, a Lua, o mar, as flores e tantas coisas bonitas da natureza, elas usufruem tudo, na maioria das vezes, sem se dar conta de como isso é útil e bom. E, conseqüentemente, não dão valor à natureza que está, sempre esteve e sempre estará lá.

Porém, se a criança for convidada a pensar que, como o reizinho perdeu o Sol, ela poderá também perder algo que lhe dá prazer e poderá ver com outros olhos aquilo que tem facilmente e com fartura.

Este conceito está muito ligado às questões ecológicas, cada dia se fala mais na necessidade de preservarmos o meio ambiente para garantir que as futuras gerações tenham água, árvores, oxigênio e para cessar a extinção de várias espécies de animais e de plantas.

É importante que se desenvolva nas crianças uma conscientização ecológica para que elas aprendam a valorizar, a respeitar e a amar a natureza, para, somente depois disso, assumirem uma atitude responsável perante o meio ambiente.

Esta história pode ser o primeiro passo para o início de uma reflexão sobre todas as coisas boas que Deus colocou na terra, de graça, para o homem usufruir. Em seguida, talvez a criança precise que os seus pais chamem atenção para a beleza do pôr do Sol, a delicadeza de uma flor, a incontável variedade de pássaros, a sabedoria do ciclo das águas, a grandiosidade das estrelas no infinito. Isso aumentará as possibilidades dela apreciar e poder usufruir ao máximo as maravilhas da natureza.

Despertar o amor e o cuidado com o meio ambiente formará cidadãos responsáveis, comprometidos com a sua continuidade, e é isso que o planeta precisa...

A história trabalha também as questões de responsabilidade, pois o reizinho percebe que não adianta somente ter o poder de ser obedecido, mais importante do que isso é saber dar ordens com responsabilidade.

Recurso Auxiliar

Esta história tem apenas dois personagens: a fada e o reizinho, além de uma participação muito especial do Sol. Assim, sugerimos uma técnica de narração bem aconchegante e fácil de ser trabalhada, o "andoche".

O "andoche" é uma variação do dedoche, que, por sua vez, é uma variação do fantoche. Ou seja, enquanto o fantoche é manipulado pela mão do narrador, como se fosse uma luva, o "dedoche" é manipulado apenas por um dos dedos de uma das mãos do narrador. O "andoche" é quase um "dedoche", ele tem um corpo que permite ao narrador colocar dois dedos, fazendo as vezes das suas pernas. Através do movimento dos dedos, o boneco parece que está andando e, daí, veio este nome dado pelas crianças: "andoche".

Diferente dos fantoches, eles não precisam ficar atrás de uma janela, podem andar livremente, pois têm pernas. Aliás, esta é uma prática usualmente feita com crianças, pois quem não brincou de “dedinhos” correndo pela mesa atrás dos “dedinhos” da criança? E esta simples prática dá tanto prazer à criança, que dá gargalhadas e gritos com “medo de ser pega”.

É aconselhável fazer esta narração em uma mesa onde o narrador e os ouvintes se sentam em volta. O narrador fará os dois papéis: o reizinho e a fada, um em cada mão. O Sol poderá ser “encenado” por um narrador auxiliar ou pela criança, certamente ela gostará muito de fazer este papel.

O narrador irá contando a história, e os personagens vão se movimentando conforme a situação da cena. Quando houver diálogos, é aconselhável que o reizinho e a fada tenham vozes distintas.

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